Sobre cachorros, fraldas e boias de piscina
- Maria Eduarda Mesquita
- 29 de out. de 2022
- 2 min de leitura

Eu a conheci depois de um acidente que causou um dano neurológico extenso, deixando-a acamada, tetraplégica, comunicando-se apenas com olhares e alguns outros mínimos movimentos (alguns chamam de Lock-down síndrome). Eu a conheci num momento em que ela talvez fosse a mais serena perante a ansiedade da família, que sofria para entender seu novo papel, sofria para entender que as coisas nunca mais seriam como antes - mas não precisam ser ruins.
A recebi na enfermaria para tratar uma infecção e esperar o homecare para a alta. Mas isso é o menos importante do meu trabalho. Prescrever infecção é fácil, escrever um relatório de alta é fácil. Mas fazer uma transição de cuidados bem feita, acolhendo a família e trabalhando para tornar a adaptação a nova realidade mais suave é difícil. E foi nesse contexto que eu me vi discutindo sobre cachorros, fraldas e boias de piscina.
Foi assim que discutimos que não só pode, como eu recomendo o carinho dos cachorros que ela tanto ama, e qual o problema se eles lamberem suas mãos ou deitarem em seu colo? Isso é a felicidade dela. E felicidade é saúde.
E como vamos tirar a sonda vesical se ela tem alergia a fralda? Quando vi, fomos pesquisar juntas sobre fraldas ecologicas/de pano na Shopee. E será que ela pode molhar os pés na piscina de casa, que ela adora? E foi assim que acabamos olhando boias para tetraplégicos na Amazon. Isso é a felicidade dela e a adaptação da família. E também é saúde.
Que limitado seria um cuidado que apenas prescreve remédios. Eu gosto mesmo é de prescrever lambidas de cachorro e boias de piscina. Eu gosto mesmo é de mostrar a todos que paliação é apenas o que todos nós fazemos: viver até o dia em que morreremos. E na verdade, é mais que isso: é viver bem.



perfeito!
Lindo texto ♥️♥️🥰🥰