Sobre compartilhar ou doar ou abnegar
- Maria Eduarda Mesquita
- 1 de fev. de 2023
- 2 min de leitura
Nossa crônica de hoje começa com um livro doado a um amigo. Não apenas dado, não um livro comprado em livraria e embalado com papel de presente genérico. Mas o meu livro, lido, grifado e entregue com uma dedicatória escrita a mão na primeira página. O meu livro, pois apesar de ser uma leitora voraz, poucos são os livros na minha estante: eles logo tomam asas e se espalham pelo mundo. E por isso, eu não dei o livro, eu o doei. Porque doar, segundo o dicionário, é dar gratuitamente, é entregar-se. Eu faço doações de livros e de mim mesma.
Nossa crônica de hoje também passa por caixas de chocolate dadas por pacientes, e logo abertas no refeitório para alegrar o café da equipe. A crônica passa, de maneira mais particular, por uma linda cesta de chocolate que recebi de alguns estudantes queridos, que foi também aberta e dividida entre fisioterapeutas, enfermeiros, técnicos e assistentes sociais. E enquanto uma enfermeira se admirava "ué, mas você está só oferecendo mesmo seus chocolates?", uma fisioterapeuta respondeu "Duda não tem apego as coisas assim não". Meu esposo, algum tempo depois, completou: você é muito abnegada.
E eu comecei a pensar nessas palavras. Eu sou desapegada as coisas materiais? Não acho que sou um ser humano tão evoluído ao ponto de não ligar para bens materiais. Eu sou abnegada? Novamente do dicionário "Desapego completo de suas próprias vontades". Acho que não. Eu tenho muitos sonhos, vontades, desejos.
Talvez eu tenha apenas um desejo de compartilhar. Compartilhar as descobertas e sabedoria e fantasia e tudo que adquiri naquele livro. Compartilhar a doçura de um chocolate no meio de um dia cansativo de trabalho. Dividir a minha felicidade com outros, e assim multiplicá-la.
Cada livro, cada volume que vês, tem alma. A alma de quem o escreveu e a alma dos que o leram e viveram e sonharam com ele. Cada vez que um livro muda de mãos, cada vez que alguém desliza o olhar pelas suas páginas, o seu espírito cresce e torna-se forte. - Carlos Ruiz Zafón
E por isso, eu espalho meus livros pelo mundo. Por isso, eu divido meus chocolates. Não é um triste sacrifício. Não é um esforço hercúleo. É apenas um jeito de ser feliz. Porque assim como os livros se fortalecem ao trocar de mãos, a felicidade cresce quando compartilhada. É o mistério que a matemática não alcança: ao dividir, se multiplica.
Comments